Home Governo de Portugal DGPC Home UNESCO
English Version
thesole

Cister em Alcobaça

A criação de um plano cisterciense constituiu, na definição e distribuição das diversas edificações do Mosteiro de Alcobaça, um dos mais importantes factores de normalização dado que, com poucas e justificadas excepções, seria sempre semelhante em toda a cristandade. 

As principais dependências do conjunto seriam a Igreja, com orientação definida tal como acontecia com as edificações medievais anteriores e o Claustro, o verdadeiro centro nevrálgico do mosteiro, geralmente localizado a sul do templo, sendo que em Alcobaça e por questões topográficas, se localiza a norte.

A referida orientação da Igreja significava o seu posicionamento num eixo poente-nascente, ficando a capela-mor virada para Oriente,  ou seja na direcção de Jerusalém e do túmulo de Cristo.

Em redor do Claustro distribuem-se as várias dependências conventuais, ficando a Igreja encostada a uma das galerias – a do topo sul, no caso de Alcobaça – seguindo-se, as restantes edificações, segundo uma ordem hierárquica de importância.

Deste modo, no piso térreo encontramos a Sacristia – com acesso pelo Claustro e pelo Transepto, seguindo-se a Sala do Capítulo, onde se reunia o Capítulo da Ordem, o Parlatório, e a Sala dos Monges.

Na galeria oposta à Igreja (norte) situam-se a Cozinha, o Refeitório e o Lavabo.

O primeiro piso do Claustro apresenta belíssimas galerias, cuja construção é datável  do reinado de D. Manuel I.

De facto, a localização dos mosteiros cistercienses obedecia sempre a imperativos  de implantação em terrenos que não poderiam ter grandes desníveis, isolados,  tendo como condição indispensável a presença de água. No caso de Alcobaça, são os seus dois rios (Alcoa e Baça) que possibilitam a construção do mosteiro, dotado de um sistema hidráulico que alimentava a própria abadia e que permitiu o funcionamento eficaz de latrinas junto do Dormitório.

Ainda hoje se conserva o grande canal que trazia a água para o conjunto monástico – a Levada – atravessando-o de sul para norte, passando por terrenos agrícolas da cerca do Mosteiro, mais tarde ocupados pelo Claustro do Cardeal.

Ao longo de todo o período que se estende até inícios do século XIX, os monges desenvolveram uma prodigiosa actividade agrícola, hidráulica e de povoamento. Cumprindo escrupulosamente a sua regra, cultivavam as terras, guardavam rebanhos, entregavam-se a todas as tarefas agrícolas, extraíam o ferro, forjavam as alfaias, instalaram as primeiras indústrias do País.

Desbravaram as charnecas e secaram os pântanos. Plantaram pomares, olivais e vinhas.  Em contexto de época, eram notáveis os seus conhecimentos sobre agronomia, irrigação de terras, e até metalurgia.

Não se pode afirmar com certeza que as granjas tenham sido escolas agrícolas. Provavelmente os monges conversos e o mestre da granja, dariam o exemplo e os colonos que aí se fixavam aproveitavam as alfaias e as sementes que lhes eram cedidas,  e também as lições e orientação.

Depois do longo período de implantação, o Mosteiro passou a intervir directamente no povoamento do território, através de Cartas de Povoação. Estas eram concedidas quando os monges queriam atrair colonos para um determinado local, que era cuidadosamente delimitado, com todas as condições determinadas e só então entregue.

As cartas de povoamento estipulavam o número de famílias que podiam fixar-se na zona, tendo em conta que quanto mais férteis fossem os terrenos, mais densa seria a população. Cada colono recebia uma parcela de terra e segundo indicação dos monges ficariam estipulados os tipos de culturas às quais os colonos deviam dedicar-se. Só mais tarde foram concedidos forais às povoações já suficientemente desenvolvidas para terem jus aos direitos cívicos.

O grande período de expansão da abadia teve início durante o reinado de D. Pedro I (1357/1367) e estende-se até ao reinado de D. João I (1385/1433); porém, com o passar dos séculos os coutos tornaram-se num feudo poderoso, com a figura também poderosa do D. Abade ao centro.

O enriquecimento correspondeu, na prática, a um crescimento territorial.  É com dificuldade que actualmente se conseguem traçar os limites desta imensa área que,  por certo,  abrangia muito mais que os actuais concelhos de Alcobaça e da Nazaré, incluindo também parte dos concelhos da Marinha Grande, Porto de Mós e Caldas da Rainha.

Tamanha riqueza e poder repercutiram-se de forma inevitável sobre a vida religiosa e observância monástica. A sábia administração do domínio deu lugar a um feudalismo exacerbado, com aumento de impostos e nova interpretação dos forais.

Cresciam os privilégios à medida que o poder e riqueza da abadia aumentavam: a decadência era portanto inevitável.

A situação foi fortemente agravada com a instituição do regime das comendas e só conhece melhoras com a instauração da Congregação Autónoma Portuguesa, nos finais do século XVI, dado que os infantes comendatários empreendem melhorias significativas  no Mosteiro.

Em 1755 com o terramoto e em 1772 com as inundações, o Mosteiro sofre graves danos, o que fez com que se recorresse a empréstimos para as obras de reconstrução. Estes deram origem a um terrível colapso financeiro.

Após o grande fausto e opulência dos séculos XVI e XVII e  o apogeu  do barroco, já não havia forma de travar a decadência financeira. Para agravar este quadro, as invasões francesas de 1810, depauperaram a abadia. Os danos foram irreparáveis na Igreja, com roubos e saques de objectos preciosos e  queima de várias dependências do Mosteiro.

As novas ideias introduzidas pela Revolução Francesa,  agravaram a hostilidade contra os monges, inviabilizando o recurso a novos empréstimos para a reconstrução. A situação tornou-se ainda mais hostil, quando em 1833, a população local invade o Mosteiro e o saqueia: a estes juntaram-se pessoas vindas dos arredores, bem como os soldados franceses, acantonados em Peniche.

Com grande dificuldade foram salvos manuscritos e livros da Biblioteca que actualmente constituem os valiosos arquivos da Biblioteca Nacional de Lisboa e do Arquivo Nacional da Torre do Tombo. 

A extinção das ordens religiosas em 1834, ditou o abandono do cenóbio do Mosteiro de Alcobaça e pela primeira vez em séculos, deu a conhecer aos alcobacenses o interior dos espaços monásticos.

rss